quinta-feira, 24 de maio de 2007

SE VIRANDO, MAS SEM SE MEXER

Gabriel Senna
Leandro Maia
No meio da Praça Sete, em Belo Horizonte, o mundo praticamente acontece. Ali, tem um pouco de tudo, do mais comum ao que Deus duvida. Um lugar onde o tempo é curto e, por isso, os passos são largos, apressados. É ali, bem no centro do centro de uma capital cada vez mais frenética que um homem resolveu ganhar a vida com calma, devagar, sem se mexer. Literalmente. Jéferson da Silva é a mais antiga estátua viva, ainda em atuação, de Belo Horizonte.

Em meio a multidão, Jéssica, de 5 anos, pára, espia, e não acredita no que vê. Olha de novo, desconfiada, e continua admirando. Incentivada pelo pai, coloca o dinheiro na caixinha e, de súbito, vem um agradecimento pela gentileza. A estátua se move, manda beijos, e ela, responde com uma gargalhada gostosa que anda em falta por aí. Daquelas que se vê apenas de vez em quando. Cada vez mais de vez em quando. De quebra, coloca mais uma moedinha. E assim, Jéferson vai criando seus dois filhos e sua mulher...

Uma contradição. Inversão da lógica. A estátua, para ganhar a vida, precisa se mover. Quanto mais se mexe, mais ganha. Ficar parado não é lucro. O maior prejuízo que já tomou, foi quando bateu seu próprio recorde. Ficou 6, seis, s-e-i-s horas sem se mexer. Nem um pio. Nem um frame de sorriso. Nem uma piscadela sequer. Ele jura e, quem passa por ali, acredita.

Às vezes, alguém duvida da eficiência da estátua. Já tentaram de tudo para fazê-lo se mexer. Fazem graça, mostram careta, ameaçam empurrá-lo do banquinho de 30 cm que o sustenta. Tudo em vão. Mas um dia, ele confessa, tremeu nas bases. Achou que fosse o fim de sua carreira. Sim, porque estátua que não tem auto-controle não é digno da profissão. A investida de um transeunte foi forte. O rapaz ficou a manhã inteira passando de lá pra cá com uma galinha na cabeça. E pior, a galinha era malabarista, ficava em cima da careca dele apenas com um pé. Quando cansava, mudava para outro pé, aos pulinhos... Mas não! Nem um esboço de sorriso.

A única vez que perdeu a pose foi quando um espertinho meteu a mão na caixinha do seu ganha-pão. Ele desceu do banquinho e saiu atrás do larápio. Quem estava por perto, se surpreendeu com a velocidade da estátua, sempre tão calma!. Voltou com o dinheiro: 0,50 centavos. E nunca mais se ouviu falar em quem o fizesse de bobo.

Jéferson foi apresentado à profissão pela irmã, quando tinha 16 anos. Ela trouxe a idéia depois de uma breve estadia na França. No início, como toda novidade, chamava à atenção e o lucro era grande. Não se lembra quanto, mas como todo bom saudosista, sabe que era bem mais que hoje. Discreto, não revela quando ganha “nem sob tortura”, mas naquela manhã de terça-feira, disse que o dia estava ruim, que não deu para tirar muita coisa.

Mas como tudo é relativo, pouco antes, Clóvis, um morador de rua que passava por ali, não resistiu a tentação e foi conferir o quanto tantas mãos havia deixado naquele “pote”. Ele olha e diz inconformado: “Ta danado. Preciso arrumar um bico desses”. Talvez seja por isso que Jéferson não troca de profissão. Tem se mantido de pé, imóvel, já há 16 anos.

2 Comentários:

Blogger 8o JN 1/2007 disse...

Geane,

Voltamos atrás da estátua para tirar fotos, mas ela não estava na Praça 7 nem na segunda, nem terça, nem quarta.

No domingo ela fica na feira-hippie. Iremos até lá e na segunda acrescentaremos a foto no blog, ok?

Abs,

Gabriel

24 de maio de 2007 às 05:55  
Blogger 8o JN 1/2007 disse...

Bom texto! Ótimo lead! Cuidado com o uso das vírgulas...
Geane

24 de maio de 2007 às 06:08  

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